Dentadas

DENTADAS partiu da vontade da autora em manifestar-se contra a guerra que a América desencadeou a partir do 11/09. Inserida no movimento organizado em Inglaterra por artistas das mais variadas áreas “Artistas Contra a Guerra”, Kay Adshead fez desta peça o seu protesto. O movimento veio a ter repercussões em todo o mundo, resultando em obras diversas, da literatura à pintura.
A ESCOLA DE MULHERES quer também com este espectáculo juntar a sua voz à de todos os que dizem NÃO À GUERRA, fazendo suas as palavras que Arthur Miller utilizou em 1963 na mensagem internacional que escreveu para o 2º Dia Mundial do Teatro:

Hoje a questão da destruição ou da sobrevivência do homem está de certo modo posta em causa.
Num tempo em que a diplomacia e a política dispõem de braços tragicamente tão curtos e tão fracos, o alcance subtil (mas por vezes longo) da arte terá a responsabilidade de manter unida toda a comunidade humana. Tudo o que possa mostrar-nos que pertencemos ainda à mesma espécie, é uma coisa humanamente preciosa. É precioso que, neste momento, dezenas de milhares de pessoas, talvez milhões, interrompam a sua procura de entretenimento e reconheçam que, neste imenso palco planetário, o maior elenco da história precisa de encontrar uma verdadeira catarse, uma libertação do medo que nos oprime através de uma redentora tomada de consciência – pois de contrário a catástrofe desabará sobre nós. O dramaturgo anónimo que nos distribuiu os papéis que desempenhamos, esse grande ironista, esse extraordinário humorista, fez do palco o nosso mundo. O incremento da ciência transformou-nos a todos em actores: já não há público para o grande silêncio que ameaça envolver-nos a todos no seu manto fúnebre.
Falo, evidentemente, do problema da guerra; mas implícito está em todas as peças de algum significado, e sempre esteve, o destino do Homem. A única diferença que agora existe, mas que é fundamental, é que somos nós, e não já um herói isolado, que teremos de encontrar a solução – ou perecer. A suprema ironia é que, enquanto nos sentirmos dominados por impiedosas forças destrutivas, não poderemos alcançar o que sempre exigimos aos nossos heróis trágicos: um lugar de reconciliação, um momento de aceitação, se não de resignação, um estilhaço de segundo em que reconheçamos que o nosso destino não está inscrito nos astros, mas em nós próprios. Quantos, de entre nós, no decurso destes anos, ainda que por vezes encarando o temor real da destruição, terão sido capazes de repetir, com Shakespeare, que a falta não está nos astros, mas sim em nós próprios?
É por isso que precisamos do teatro; pois, acima de tudo, o teatro coloca o homem no centro do mundo. Necessitamos de um lugar de quietude precária, de onde seja possível presenciar a tempestade e testemunhar a eterna luta do homem que desafia deus na edificação do seu próprio destino.

Na verdade, é precisamente a revelação gradual do que se não vê e do que se não pode ver que constitui a matriz oculta da própria arte dramática.

Nestes tempos em que a futilidade afogou o espírito, em que uma inacção mortal o ameaça, é bom dispormos de uma forma artística cuja própria existência é inseparável da acção.
E assim, o teatro denuncia a inacção, a ausência de sentido. Constitui um desafio para descobrirmos uma ordem interior que reflicta não apenas a morte que há na vida e a ironia de toda a acção, mas a presença da vida até na morte: um tipo de teatro capaz de oferecer ao homem uma esperança de identidade e liberdade.

Poderosamente escrita, DENTADAS mistura fantasia, surrealismo e sátira. O efeito é como se olhássemos para uma ferida infectada, que fascina pelo terror que inspira. A prova de que se podem assumir ferozes pontos de vista políticos sem perder a parte do entretenimento.

INTÉRPRETES
Cozinheira Pottleheimer, Corifeu, Mulher 1, L LUCINDA LOUREIRO
Deus Cirurgião, Polícia, Condutor Autocarro, Deus Magnata, MQ, Deus General JOSÉ WALLENSTEIN
Harry, Sammy, Mo, Hakim, BS ALBANO JERÓNIMO
Angélica, Sammy Jr,  Mulher 2, Assistente Pessoal de Deus, X SÃO JOSÉ CORREIA
Philip, Coro, Mulher de Hakim, V, Mulher de Harry LEONOR SEIXAS

texto KAY ADSHEAD
encenação ISABEL MEDINA
tradução PEDRO CAVALEIRO
dramaturgia ISABEL MEDINA | ANA VAZ
música JOÃO BENGALA
cenografia ANA VAZ
coreografia MARTA LAPA
figurinos RAFAELA MAPRIL
desenho de luz CLÁUDIA RODRIGUES
fotografia ARMANDA CLARO
design gráfico VIRGÍLIO BEATRIZ
execução de guarda-roupa ANDREIA ROCHA
execução cenográfica MARINEL MATOS | Cenários e Ambientes
caracterização SÓNIA SEABRA Ciclos de Imagem
cabelos ANABELA BALDINA Ciclos de Imagem
produção executiva MANUELA JORGE
assistência de encenação e operação de luz INÊS POMBO
construção de cenário MANUEL VITÓRIA

Sala das Novas Tendência do Teatro da Comuna
de 6 de Novembro a 02 de Dezembro, 2007